ESCRITURA PÚBLICA DE DAÇÃO EM PAGAMENTO – CND FEDERAL – PEDIDO EXPRESSO DE DISPENSA DA APRESENTAÇÃO DA CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS NOS TERMOS DA CIRCULAR CGJ 02/2018 – DÚVIDA JULGADA IMPROCEDENTE

DECISÃO

Vistos etc.

MARIA DO CARMO DE TOLEDO AFONSO, OFICIAL TITULAR DO 1º. REGISTRO DE IMÓVEIS DE CRICIÚMA/SC apresentou SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA, a fim de declarar a necessidade de apresentação da Certidão Negativa de Débitos Federais para o registro da dação em pagamento pretendida ou então a declaração da possibilidade de registro sem necessidade da apresentação.

Notificada (Doc. 4878465 – fl. 11), a suscitada apresentou impugnação (Doc. 4890387) pugnando pela desnecessidade da apresentação de Certidão Negativa de Débitos federais, determinando, por conseguinte, o registro da Escritura Pública de Dação em Pagamento nº. 70.042 lavrada pelo 1º Tabelionato de Notas e Protestos de Criciúma.

Em parecer, o Ministério Público opinou pelo acolhimento da dúvida para declarar a necessidade de apresentação da Certidão Negativa de Débitos Federais para o registro da dação em pagamento pretendida. Seguidamente, os autos vieram conclusos.

É o breve relatório.

Decido.

Trata-se de suscitação de dúvida apresentada pela Oficial do 1º Registro de Imóveis de Criciúma-SC versando sobre questionamento acerca da exigência de Certidão Negativa de Tributos federais para o registro de Escritura Pública de Dação em Pagamento.

Nessa senda, alegou que a interessada Baratão Calçados EIRELI – doravante suscitada – ingressou com três protocolos perante sua serventia sob os números 319830, 319831 e 319832.

No protocolo de nº 319832, o qual interessa para o desenlace da questão especificamente controvertida, a suscitada requereu o registro de Escritura Pública de Dação em Pagamento perfectibilizada na data de 24/07/2020 perante o 1º Tabelionato de Notas e Protestos, Livro 0955, folha 102, protocolo nº. 70.042 na qual transferia a título de dação, imóveis de sua propriedade como forma de quitação de dívida contraída junto a Calçados Beira Rio S/A, ali então qualificada como credora.

Cumpre frisar de antemão que no instrumento público mencionado a credora expressamente dispensava a apresentação de Certidão Negativa de Tributos Federais e de Dívida Ativa da União, eis que assim descrito na cláusula VII:

(…). Por fim, disseram, sob as penas da lei, que concordam com esta escritura em todos os seus termos e condições. Declarou a credora, que dispensa a Certidão de Débitos Relativos aos Tributos Federais e à Dívida ativa da União conforme decisão proferida pela Corregedoria Nacional de Justiça, nos autos n.º 1230-82.2015.2.00.0000 e Circular CGJSC nº. 2 de 8 de janeiro de 2018. (…).”

Ocorre que a Oficial competente, ao analisar a matéria, emitiu nota devolutiva (Doc. 4878481 – fl. 9) porquanto calcando suas interpretações em dispositivos relacionados à matéria, exigiu a apresentação da CND de tributos federais e do INSS nas transferências de imóveis consoante o seguinte teor:

2 – Nos termos da Lei 8.212/91, Decreto 3.048/99 e Instrução Normativa/SRF 971/2009 faz-se necessário constar na escritura pública a apresentação da Certidão Negativa de Tributos Federais e do INSS em nome do transmitente.

Assim, torna-se necessária a apresentação ou rerratificação ou aditivo à escritura pública para constar a apresentação ou a sua dispensa. Caso seja pessoa jurídica, poderá haver a dispensa se constar no título a declaração de que a transmitente explora atividade exclusivamente imobiliária, sendo que o presente imóvel está contabilmente lançado em seu ativo circulante e não obsta, e nunca constou, no ativo permanente da empresa”. (grifos no original)

A partir de então, houve sucessivo pedido de reconsideração pelo interessado devedor/dador – Baratão Calçados EIRELI (Doc. 4878483 – fl. 5), e consequente expedição de nova nota devolutiva reiterando as exigências anteriormente estabelecidas pela Oficial competente, ou seja, impondo como requisito imprescindível para o registro da escritura pública de dação em pagamento a apresentação das certidões negativas de tributos federais e do INSS. Tal contexto culminou na apresentação da suscitação de dúvida ora analisada.

Pois bem.

Analisando o caso apresentado sob a luz do mais recente contexto jurisprudencial e normativo envolvendo a matéria, e ainda que haja bem fundamentado parecer do Ministério Público tencionando pelo acolhimento da dúvida para declarar como necessária a exibição das respectivas certidões negativas de débitos, entendo que o cenário implica em improcedência da dúvida.

Isso porque com a declaração da inconstitucionalidade do art. 1º, inciso VI, “b”, através da ADI nº. 394 constatou-se importante ponto de mutação nos entendimentos jurisprudenciais e normativos a respeito da matéria. Exemplificando, o Conselho Nacional de Justiça por meio do julgamento do Recurso Administrativo em Pedido de Providências nº. 0001232-82.2015.2.00.0000 expressamente se pronunciou a respeito da desnecessidade de os cartorários exigirem certidões de débitos nas operações notariais como se ressalta:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. IMPUGNAÇÃO DE PROVIMENTO EDITADO POR CORREGEDORIA LOCAL DETERMINANDO AOS CARTÓRIOS DE REGISTRO DE IMÓVEIS QUE SE ABSTENHAM DE EXIGIR CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO PREVIDENCIÁRIO NAS OPERAÇÕES NOTARIAIS. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 47 E 48 DA LEI N. 8.2012/91. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. 1. Reconhecida a inconstitucionalidade do art. 1º, inciso IV da Lei nº 7.711/88 (ADI 394), não há mais que se falar em comprovação da quitação de créditos tributários, de contribuições federais e de outras imposições pecuniárias compulsórias para o ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis, por representar forma oblíqua de cobrança do Estado, subtraindo do contribuinte os direitos fundamentais de livre acesso ao Poder Judiciário e ao devido processo legal (art. 5º, XXXV e LIV, da CF). 2. Tendo sido extirpado do ordenamento jurídico norma mais abrangente, que impõe a comprovação da quitação de qualquer tipo de débito tributário, contribuição federal e outras imposições pecuniárias compulsórias, não há sentido em se fazer tal exigência com base em normas de menor abrangência, como a prevista no art. 47, I, “b”, da Lei 8.212/91. 3. Ato normativo impugnado que não configura qualquer ofensa a legislação pátria, mas apenas legítimo exercício da competência conferida ao Órgão Censor Estadual para regulamentar as atividades de serventias extrajudiciais vinculadas ao Tribunal de Justiça local. RECURSO IMPROVIDO (CNJ – RA – Recurso Administrativo em PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0001232-82.2015.2.00.0000 – Rel. João Otávio de Noronha – 28ª Sessão Virtual – julgado em 11/10/2017).

Não destoando da orientação emanada pelo CNJ, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina no julgamento do Pedido de Providências nº. 0001320-95.2017.8.24.0600 fixou orientação estampada por meio da Circular nº. 2 de 8 de janeiro de 2018, a qual por propiciar importante conclusão a respeito da matéria, é salutar a lembrança em sua inteireza: CONSULTA. DECISÃO DO CNJ RATIFICANDO A DISPENSA DE APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS TRIBUTÁRIOS (CND) PARA A PRÁTICA DE ATOS NO REGISTRO DE IMÓVEIS. INTERPRETAÇÃO CORRETIVA. MANUTENÇÃO DOS DISPOSITIVOS NORMATIVOS DESTA CGJ. EXPEDIÇÃO DE CIRCULAR.

Excelentíssimo Senhor Vice-Corregedor-Geral,

Trata-se de consulta encaminhada pelo Sr. Luis Eduardo Kelmer, registrador do 2º Ofício de Registro de Imóveis da comarca de São Francisco do Sul, na qual questiona os efeitos decisão proferida pela Corregedoria Nacional de Justiça, nos autos n. 1230-82.2015.2.00.0000. Formulou os seguintes quesitos: a) o efeito da referida decisão pode ser considerado “erga omnes”?; e b) a dispensa se refere apenas aos atos de averbação de construção, ou também às alienações e onerações? É o sucinto relatório.

Colhe-se da ementa do acórdão proferido no pedido de providências n. 1230-32.2015.2.00.0000:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. IMPUGNAÇÃO DE PROVIMENTO EDITADO POR CORREGEDORIA LOCAL DETERMINANDO AOS CARTÓRIOS DE REGISTRO DE IMÓVEIS QUE SE ABSTENHAM DE EXIGIR CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO PREVIDENCIÁRIO NAS OPERAÇÕES NOTARIAIS. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 47 E 48 DA LEI N. 8.212/91. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE.

1. Reconhecida a inconstitucionalidade do art. 1º,inciso IV da Lei nº 7.711/88 (ADI 394), não há mais que se falar em comprovação da quitação de créditos tributários, de contribuições federais e de outras imposições pecuniárias compulsórias para o ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis, por representar forma oblíqua de cobrança do Estado, subtraindo do contribuinte os direitos fundamentais de livre acesso ao Poder Judiciário e ao devido processo legal (art. 5º, XXXV e LIV, da CF).

2. Tendo sido extirpado do ordenamento jurídico norma mais abrangente, que impõe a comprovação da quitação de qualquer tipo de débito tributário, contribuição federal e outras imposições pecuniárias compulsórias, não há sentido em se fazer tal exigência com base em normas de menor abrangência, como a prevista no art. 47, I, “b”, da Lei 8.212/91.

3. Ato normativo impugnado que não configura qualquer ofensa a legislação pátria, mas apenas legítimo exercício da competência conferida ao Órgão Censor Estadual para regulamentar as atividades de serventias extrajudiciais vinculadas ao Tribunal de Justiça local.

RECURSO IMPROVIDO. Por outro lado, esta Corregedoria-Geral da Justiça possui dispositivos no Código de Normas que exigem a apresentação da Certidão Negativa de Débitos para a prática de determinados atos, são eles:

Art. 692. Para averbação de obra de construção civil (construção, reconstrução, demolição, reforma ou ampliação de prédios), é necessária a apresentação de licença municipal e dos documentos exigidos pela legislação previdenciária (certidão negativa de débito – CND -, quando for o caso).

Art. 731. Se o imóvel urbano a ser parcelado era, há menos de 5 (cinco) anos, considerado rural, o oficial exigirá certidão negativa de débitos expedida pelo órgão competente.

Art. 779. Faculta-se a averbação parcial da construção com especificação parcial do condomínio, mediante apresentação de licença de ocupação (habite-se parcial) e da CND do INSS, em hipóteses como as seguintes:

I – construção de uma ou mais casas, em empreendimento do tipo “vila de casas” ou “condomínio fechado”;

II – construção de um bloco em uma incorporação que preveja dois ou mais blocos; e

III – construção da parte térrea do edifício, constituída de uma ou mais lojas, estando em construção o restante do prédio.

(…)

Art. 802. Na lavratura de escritura relativa a imóvel, se for o caso, far-se-á menção:

(…)

VI – à certidão negativa de débitos relativos às contribuições à seguridade social, incidentes sobre receita ou faturamento e lucro, no caso de alienação ou constituição de ônus real referente a imóvel integrante do ativo permanente da empresa ou pessoa, jurídica ou física, a ela equiparada na legislação tributária;

Por sua vez, o Código Tributário Nacional, em seu art. 130, regula a responsabilidade tributária do adquirente, in verbis:

Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.

Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a subrogação ocorre sobre o respectivo preço.

No mesmo norte, o art. 48 da Lei 8.212/91:

Art. 48. A prática de ato com inobservância do disposto no artigo anterior, ou o seu registro, acarretará a responsabilidade solidária dos contratantes e do oficial que lavrar ou registrar o instrumento, sendo o ato nulo para todos os efeitos.

Tem-se de um lado a impossibilidade de vedação do ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis como forma de cobrança indireta de créditos tributários e, de outro, a sucessão dessa dívida em caso da não quitação do referido crédito tributário pelo alienante.

Dessa forma, a melhor forma de harmonizar essa aparente antinomia é manter os dispositivos normativos supracitados no Código de Normas utilizando-se de uma interpretação corretiva.

Assim, continua sendo exigível a apresentação da CND, contudo sua ausência não obstruirá a operação financeira no registro imobiliário. Ou seja, quando não for apresentada a certidão negativa de débito, o adquirente deverá expressamente dispensá-la.

Na lavratura de escritura pública já existe previsão expressa no Código de normas de como deverá proceder o tabelião no caso de dispensa da exibição de certidão relativa a tributo incidente sobre imóvel urbano (art. 806).

A mesma sistemática deverá ser adotada nos contratos particulares, ou seja, a dispensa deverá constar expressamente no título, nos termos do art. 806 do CNCGJ.

Porém, caso o ato a ser praticado seja uma averbação de construção, deverá constar na escrituração do ato a ausência de apresentação da CND, sendo vedada a averbação apartada.

A informação sobre a não apresentação da CND deverá constar no mesmo ato em que for lavrado o principal e não poderá ensejar qualquer custo adicional ao usuário do serviço extrajudicial.

Por fim, em relação aos questionamentos formulados, entende-se que a decisão proferida pela Corregedoria Nacional de Justiça, nos autos n. 1230-82.2015.2.00.0000, não possui efeito “erga omnes”, todavia, não se pode ignorar o posicionamento jurisprudencial e, assim, as serventias extrajudiciais deverão doravante adotar o procedimento relatado neste parecer para todos os atos em que o ordenamento jurídico exigir a prévia apresentação da certidão negativa de débitos (CND) como condição para a prática de atos notariais ou registrais. Ante o exposto, opina-se pela divulgação do teor deste parecer, com a expedição de circular a todas as serventias extrajudiciais do Estado de Santa Catarina.

É o parecer que submeto à apreciação de Vossa Excelência.

Florianópolis (SC), 30 de novembro de 2017.

Luiz Henrique Bonatelli

Juiz Corregedor

Autos n° 0001320-95.2017.8.24.0600

Pedido de Providências

Requerente: 2º Registro de Imóveis da comarca de São Francisco do Sul e outro

DECISÃO

1. Acolho os fundamentos e a conclusão do parecer do Juiz Corregedor Luiz Henrique Bonatelli.

2. Expeça-se circular nos termos do parecer retro.

3. Após, arquivem-se os autos.

Florianópolis (SC), 04 de dezembro de 2017.

Desembargador Salim Schead dos Santos

Vice-Corregedor-Geral da Justiça

Como se percebe, o entendimento ressalva a desnecessidade de apresentação de certidão negativa de tributos caso o interessado adquirente expressamente declare a dispensa de apresentação, tudo como forma de conciliar o acesso ao sistema registral de imóveis, a impossibilidade de cobrança indireta de tributos e a segurança jurídica exigida nas situações envolvendo responsabilidade em razão de eventual assunção de dívidas tributárias pelos adquirentes.

Precisamente, tal ponto é digno de nota porquanto como se depreende de detida análise do contexto trazido a este juízo, a credora – Beira Rio Calçados S/A (credora e adquirente dos imóveis através da operação de dação em pagamento) – assim como já destacado acima, expressamente anuiu à desnecessidade de apresentação de Certidão Negativa de Tributos federais e Dívida Ativa da União por meio de cláusula inserida na Escritura Pública de Dação em Pagamento cujo registro quedou obstado pela Oficial de Registro Imobiliário competente.

Tal negativa, então, não deve consubstanciar-se em empecilho para que as partes concluam a avença entabulada. Inclusive, a impugnação à dúvida apresentada foi endereçada diretamente pela credora (adquirente dos imóveis especificados na Escritura Pública de Dação em Pagamento), situação que reforça sua concordância anteriormente demonstrada na escritura pública.

Ao arremate, as recentes decisões proferidas em âmbito de Ação Direta de Inconstitucionalidade e em Recurso Administrativo julgado pelo Conselho Nacional de Justiça inculcaram novas conclusões perante o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o qual se alinhando ao novel entendimento, não se resumiu apenas à expedição da Circular Circular nº. 2 de 8 de janeiro de 2018, mas também à aplicação concreta em situações semelhantes a discutida nesta suscitação de dúvida como se percebe em recentíssima decisão:

RECURSO ADMINISTRATIVO (APELAÇÃO) EM SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE “CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL E RESPECTIVA FRAÇÃO IDEAL DE TERRENO”. EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO (CND) EM NOME DA PROMITENTE VENDEDORA. PRETENDIDA DISPENSA POR PARTE DA PROMITENTE COMPRADORA. ACOLHIMENTO. INEXIGIBILIDADE RECONHECIDA PELO PLENÁRIO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ) (JULGAMENTO EM 11-10-2017). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. “1. Reconhecida a inconstitucionalidade do art. 1º, inciso IV da Lei nº 7.711/88 (ADI 394), não há mais que se falar em comprovação da quitação de créditos tributários, de contribuições federais e de outras imposições pecuniárias compulsórias para o ingresso de qualquer operação financeira no registro de imóveis, por representar forma oblíqua de cobrança do Estado, subtraindo do contribuinte os direitos fundamentais de livre acesso ao Poder Judiciário e ao devido processo legal (art. 5º, XXXV e LIV, da CF). 2. Tendo sido extirpado do ordenamento jurídico norma mais abrangente, que impõe a comprovação da quitação de qualquer tipo de débito tributário, contribuição federal e outras imposições pecuniárias compulsórias, não há sentido em se fazer tal exigência com base em normas de menor abrangência, como a prevista no art. 47, I, “b”, da Lei 8.212/91” (CNJ, Recurso Administrativo em Pedido de Providências n. 0001230-82.2015.2.00.0000, julgado em 11-10-2017). (TJSC, Recurso Administrativo (Apelação) n. 0024250- 63.2020.8.24.0710. Relator Conselheiro Des. Júlio César M. Ferreira de Melo, julgado em 14-09-2020).

O referido aresto ainda faz menção a acórdão do Conselho da Magistratura que decidiu situação análoga assim ementada:

RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE ESCRITURA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO – CND. PRETENDIDA A DISPENSA DE APRESENTAÇÃO DA CND POR PARTE DA EMPRESA TRANSMITENTE DO IMÓVEL. ALEGADA COBRANÇA DO ESTADO POR VIA OBLÍQUA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DO ART. 1º, I, III E IV, E §§ 2º E 3º, DA LEI N. 7.711/88. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA QUE AFASTA A INCIDÊNCIA DO ART. 47, I “B”, DA LEI N. 8.212/91. DISPENSA PELA RECORRENTE, NO INSTRUMENTO DE VENDA E COMPRA, DA EXIBIÇÃO DE CERTIDÕES NEGATIVAS DE DÉBITOS FISCAIS E QUE ASSUMIU A RESPONSABILIDADE DAÍ DECORRENTE. EXIGÊNCIA DA CND AFASTADA. RECURSO PROVIDO (TJSC, Acórdão do Conselho da Magistratura, Recurso Administrativo n. 2018.900035-4 Relator: Desembargador Roberto Lucas Pacheco, Comarca de Joinville, julgado em 13/08/2018) (grifou-se).

Ademais, o próprio acórdão menciona a existência de antigos julgados em sentido contrário, isto é, reconhecendo a necessidade de apresentação de CND, contudo também expressamente consta tratar-se de entendimento superado perante o novo contexto.

Perante o contexto apresentado, é forçoso concluir pelo descabimento da exigência imposta pela Oficial Registradora nas notas devolutivas desferidas no contexto do registro da Escritura Pública de Dação em Pagamento de protocolo nº. 70.042, ou seja, há que se reconhecer a desnecessidade de apresentação das Certidões Negativas de Débitos de tributos federais e de Dívida Ativa da União como pré-requisito para o respectivo registro, seja pelas recentes decisões e atos regimentais expedidos pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, seja pela expressa concordância do adquirente quanto à desnecessidade da apresentação das certidões.

Por fim, no que diz respeito aos honorários advocatícios, diga-se que “No processo de dúvida, dada a sua natureza administrativa e a impossibilidade de se constituir caráter contencioso em seu bojo, descabe a sucumbência” (CENEVIVA, Walter. Lei dos registros públicos comentada. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 449).

DIANTE DO EXPOSTO

JULGO IMPROCEDENTE os pedidos formulados na presente SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA por MARIA DO CARMO DE TOLEDO AFONSO, OFICIAL DO 1º REGISTRO DE IMÓVEIS DE CRICIÚMA/SC para declarar como possível o registro da Escritura Pública de Dação em Pagamento nº. 70.042 lavrada pelo 1º Tabelionato de Notas e Protestos de Criciúma, Livro 0955, folha 102, protocolo nº. 70.042 sem a necessidade de apresentação de Certidão Negativa de Débitos federais.

Sem custas judiciais, consoante o art. 207 da Lei n.º 6.015/73, e honorários advocatícios.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Após, arquive-se com as cautelas de estilo.

Documento assinado eletronicamente por ELIZA MARIA STRAPAZZON, JUÍZA DE DIREITO DE ENTRÂNCIA ESPECIAL, em 07/10/2020, às 13:58, conforme art. 1º, III, “b”, da Lei 11.419/2006.

A autenticidade do documento pode ser conferida no site http://sei. tjsc.jus.br/verificacao informando o código verificador 4937180 e o código CRC F85EAC0C.