PARCELAMENTO DO SOLO – PEDIDO DE DESMEMBRAMENTO – PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO SENTIDO DE QUE O PARCELAMENTO DO SOLO DEVE OCORRER NA MODALIDADE DE LOTEAMENTO – SISTEMA VIÁRIO PREEXISTENTE – DESMEMBRAMENTO VIÁVEL – DÚVIDA JULGADA IMPROCEDENTE

DECISÃO

Trata-se de suscitação de dúvida apresentada por Priscila Luísa Probst, Oficiala Registradora Interina do Cartório de Registro Civil e Imóveis desta Comarca.

Narra a suscitante, em síntese, que na serventia foi apresentado pelos interessados João Paulo e Maria Nienckotter Paulo pedido de parcelamento do imóvel matriculado sob o n. 5.654, na modalidade desmembramento; que, após cumpridas as formalidades legais e normativas, o procedimento foi remetido ao Ministério Público, que se manifestou pelo indeferimento do procedimento, ao fundamento de que o parcelamento do solo deveria ocorrer na modalidade de loteamento; que, então, notificou os interessados para que, no prazo de 30 dias, adequassem o procedimento à modalidade de loteamento ou, alternativamente, suscitassem dúvida (5430141).

Notificados (5430181), os interessados apresentaram procuração (5446048) e impugnação ao parecer ministerial sustentando, em resumo, que o imóvel a ser desmembrado está situado no lado impar de via pública e atende todos os requisitos de lei para o desmembramento, possuindo a infraestrutura básica exigida; que nenhum imóvel ficará encravado, nem mesmo os dos confrontantes, sendo todos devidamente habitáveis e acessíveis. Postularam, ao final, a procedência da impugnação, com a determinação de parcelamento do imóvel na forma de desmembramento (5446059).

Suscitada a dúvida, o Ministério Público apresentou parecer no qual manifestou oposição ao registro na forma como pretendida, manifestando-se pela manutenção das exigências apresentadas pela Oficiala do Registo de Imóveis da Comarca de Rio do Campo (5472747).

É o relato.

Na hipótese dos autos verifica-se divergência acerca da modalidade de parcelamento do solo admissível, se desmembramento, como pretendem os interessados João Paulo e Maria Nienckotter Paulo, se loteamento, como sustenta o Ministério Público.

O parcelamento do solo para fins urbano é regido pela Lei 6.766/1979, que estabelece duas modalidades, quais sejam, loteamento e desmembramento, conceituados nos §§1º e 2º do seu art. 2º:

§ 1o Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes.

§ 2o Considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.

Como se vê, a distinção básica é dada pela Lei tendo como parâmetro a necessidade ou não de abertura, modificação ou ampliação de novas vias de circulação, o que é admitido quanto ao loteamento, mas vedado em se tratando de desmembramento.

Ainda, é relevante para a questão o conceito de lote, assim considerado “o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe (art. 2º, § 4º, da Lei 6.766/1979).

A infraestrutura básica, por sua vez, dos parcelamentos, que abrange tanto o loteamento como o desmembramento, é constituída pelos “equipamentos urbanos de escoamento das águas pluviais, iluminação pública, esgotamento sanitário, abastecimento de água potável, energia elétrica e domiciliar e vias de circulação” (art. 2º, § 5º, da Lei 6.766/1979), com exigência mitigada para as zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse social – ZHIS (art. 2º, § 6º, da Lei 6.766/1979).

Anoto que a Lei Estadual 17.492/2018, que dispõe, dentre outras matérias, sobre o parcelamento do solo no Estado de Santa Catarina, apresenta os mesmos conceitos de loteamento e desmembramento em seu art. 2º, VII, ‘a’ e ‘j’, com acréscimo de exigência no que se refere à infraestrutura básica, abrangendo também pavimentação, meio-fio e calçadas (art. 2º, XII).

O imóvel em questão contém área de 13.994,35 (treze mil, novecentos e noventa e quatro metros quadrados e trinta e cinco decímetros quadrados), totalmente situada dentro do perímetro urbano do Município, em conformidade com a Lei Municipal n. 1.824/2012 (certidão de fl. 20 do doc. 5430152).

O Município de Rio do Campo concedeu aos interessados alvará de parcelamento do solo n. 13/2020, com indicação da “natureza desmembramento”, com o total de 24 lotes de tamanhos variados, entre 1.333,74m² e 253,95m² (fl. 27, doc. doc. 5430152) e certificou, dentre outros, que o requerimento atende as Leis Complementar Municipal de ns. 14/2013 e 18/2013 e a Lei Federal 6.766/1979 e possui a infraestrutura básica discriminada na Lei Federal, a saber, a) escoamento das águas pluviais; b) iluminação pública; c) esgotamento sanitário utilizando-se do sistema fossa séptica e sumidouro; d) abastecimento de água potável; e) energia elétrica pública e domiciliar; f) vias de circulação (fl. 28, doc. 5430152).

Do mapa e memorial descritivo apresentados (doc. 5430163) verifica-se que todos os lotes confrontam com via pública já existente, sem necessidade de qualquer modificação, prolongamento ou ampliação a fim de possibilitar o acesso.

Os fundamentos apresentados pelo Ministério Público, relevantes, se amoldam ao máximo desejável, todavia não se pode impor exigências além daquelas expressamente constantes na lei.

Das características do imóvel não vislumbro tentativa de burla às regras do loteamento, cabendo consignar que embora haja previsão de dois lotes de maior tamanho, contendo 1.333,74m² (lote 1) e 1.181,32m² (lote 3), o que poderia induzir presunção de futuros novos desmembramentos, verifica-se que ambos possuem considerável faixa non aedificandi, respectivamente de 989,75m² e 418,21m², o que desautoriza presunção hipotética, sem base em elementos concretos, de novo e futuro parcelamento.

Portanto, porque preenchido o requisito legal fundamental, não havendo necessidade de abertura de novas vias e logradouros públicos, nem de prolongamento, modificação ou ampliação daquela já existente, como expressamente declarado pela Municipalidade, que emitiu alvará de autorização para o desmembramento, deve ser julgada improcedente a dúvida suscitada.

É a decisão.

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada por Priscila Luísa Probst, Oficiala Registradora Interina do Cartório de Registro Civil e Imóveis desta Comarca, para reconhecer a possibilidade, em tese, de desmembramento do imóvel, nos termos do art. 2º, § 2º, da Lei 6.766/1979, cabendo à Oficiala a análise dos requisitos legais para fins de realização do registro.

Sem custas (art. 207, Lei n. 6.015/1973). Intimem-se. Notifique-se o Ministério Público.

Transitada em julgado, cumpra-se o disposto no art. 203, I, da Lei n. 6.015/1973, se for o caso, e, oportunamente, arquivem-se.

Documento assinado eletronicamente por GRISELDA REZENDE DE MATOS MUNIZ CAPELLARO, JUÍZA DE DIREITO DE ENTRÂNCIA INICIAL, em 07/05/2021, às 17:59, conforme art. 1º, III, “b”, da Lei 11.419/2006. 0011634-22.2021.8.24.07105493452v30