PROCEDIMENTO DE INTIMAÇÃO DE DEVEDOR EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – AVERBAÇÃO DE LEILÕES NEGATIVOS – IMPRESCINDIBILIDADE DA NOTIFICAÇÃO PESSOAL DEVEDOR FIDUCIANTE ACERCA DA DATA DOS LEILÕES

DECISÃO

Trata-se de Suscitação de Dúvida encaminhada pelo Oficial do Registro de Imóveis da Comarca de Ibirama, a requerimento da Caixa Econômica Federal, dada a irresignação desta quanto às exigências solicitadas para averbação de leilões negativos e consequente baixa de alienação fiduciária no imóvel matriculado sob o nº 13.193.

A Caixa Econômica Federal requereu a averbação dos leilões negativos e o consequente cancelamento do ônus de alienação fiduciária constante no R.11 da matrícula nº 13.193, na forma do art. 27, § 6º, da Lei nº 9.514/97. Sustenta, em suma, que não sobrevieram interessados no imóvel durante a 1ª e 2ª praças do leilão, de modo que considerada extinta a dívida e referido bem passou a ser de sua propriedade.

Todavia, conforme exigências colacionadas no feito, o Oficial entendeu que os leilões devem ser novamente realizados, pois não notificado pessoalmente o devedor fiduciante acerca das datas, a fim de que pudesse exercer seus direitos, conforme art. 27, § 2º-A da Lei nº 9.514/97.

Foram apresentadas razões e impugnação pelas partes.

Instado, o Ministério Público manifestou-se pela manutenção da negativa do Ofício de Registro de Imóveis.

É o relatório.

DECIDO.

A Lei nº 13.465/2017 acrescentou o § 2º-A ao art. 27 da Lei nº 9.514/97, o qual prevê a necessidade de notificação pessoal do devedor fiduciante acerca das datas de realização do leilão:

§ 2º-A. Para os fins do disposto nos §§ 1o e 2o deste artigo, as datas, horários e locais dos leilões serão comunicados ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico.

Outrossim, a jurisprudência Catarinense, embasada em precedentes do STJ, esclarece os termos da norma, posicionando-se no sentido de que é fundamental a intimação pessoal do devedor sobre as datas do leilão extrajudicial. A propósito:

AGRAVO POR INSTRUMENTO. Ação de nulidade de leilão extrajudicial com pedido de tutela de urgência de natureza antecipada.

IMÓVEL DADO EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. REGRAMENTO DA LEI N. 9.514/97. INTERLOCUTÓRIO QUE INDEFERIU o pleito antecipatório de manutenção da parte agravante na posse do imóvel até o trânsito em julgado da actio. Insurgência da parte autora. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DA PARTE DEVEDORA FIDUCIANTE ACERCA DO LEILÃO EFETUADO.

Declaração unilateral da parte credora fiduciária afirmando que teria atendido ao comando legal. Insubsistência. Declaração unilateral do credor que não tem o condão de configurar prova segura da notificação.

IMPRESCINDIBILIDADE DA NOTIFICAÇÃO PESSOAL, TENDO EM VISTA O DIREITO DE PREFERÊNCIA FACULTADO AO DEVEDOR FIDUCIANTE PARA A AQUISIÇÃO DO IMÓVEL ATÉ A DATA DA REALIZAÇÃO DO SEGUNDO LEILÃO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE ESTADUAL. Reforma do interlocutório. Recurso conhecido e provido. “Nos contratos de alienação fiduciária de coisa imóvel, regidos pela Lei nº 9.514/97, é necessária a intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial.

Precedentes” (AgInt no AREsp 1109712 / SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão. J. em: 24/10/2017). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5001943-60.2019.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Carlos Adilson Silva, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 16-07-2020, grifou-se).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL DADO EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PROCEDIMENTO DE CONSOLIDAÇÃO DE PROPRIEDADE PROMOVIDO SOB O REGRAMENTO DA LEI N. 9.514/97. SENTENÇA QUE ACOLHE A PRETENSÃO DO CREDOR FIDUCIÁRIO. INSURGÊNCIA DO RÉU. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR FIDUCIANTE ACERCA DO LEILÃO EFETUADO. MATÉRIA INCONTROVERSA NOS AUTOS. IMPRESCINDIBILIDADE DA NOTIFICAÇÃO PESSOAL, TENDO EM VISTA O DIREITO DE PREFERÊNCIA FACULTADO AO DEVEDOR FIDUCIANTE PARA A AQUISIÇÃO DO IMÓVEL ATÉ A DATA DA REALIZAÇÃO DO SEGUNDO LEILÃO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE ESTADUAL. “Nos contratos de alienação fiduciária de coisa imóvel, regidos pela Lei nº 9.514/97, é necessária a intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial. Precedentes” (AgInt no AREsp 1109712 / SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão. J. em: 24/10/2017). […] RECURSO PROVIDO PARA CASSAR A SENTENÇA E DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA O SEU REGULAR PROCESSAMENTO, COM A DESIGNAÇÃO DE NOVA HASTA PÚBLICA. (TJSC, Apelação Cível n. 0300231-37.2018.8.24.0144, de Rio do Sul, rel. Carlos Adilson Silva, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 07-05-2020, grifou-se).

Logo, inconteste que a notificação do devedor quanto aos dados (data, horário e local) do leilão deve ser pessoal. In casu, contudo, não procedida a notificação pessoal.

In casu, contudo, não procedida a notificação pessoal.

Veja-se que a tentativa de notificação do devedor fiduciante ocorreu apenas pelos correios, tendo a carta sido devolvida. Ainda, conforme pontuado pelo Oficial do Registro de Imóveis, inexistiam informações precisas sobre o endereço na correspondência, que possibilitassem ao carteiro identificar o destinatário. Ademais, a correspondência somente foi encaminhada para o endereço do imóvel dado em garantia, ignorando-se o endereço do domicílio do devedor indicado no contrato. Além disso, mister registrar que a Lei nº 13.465/17 entrou em vigor em 12/07/2017, quando publicada no Diário Oficial, de modo que afastada a tese da Caixa Econômica Federal de que a vigência daquela legislação ocorreu apenas em data posterior a que realizados os leilões. Nesse contexto, forçoso concluir que razão assiste ao Oficial do Registro de Imóveis, devendo os leilões serem novamente realizados, havendo prévia e pessoal notificação pessoal do devedor fiduciante, a fim de possibilitar o exercício amplo de seus direitos.

Diante do exposto, julgo improcedente a Suscitação de Dúvida apresentada pela CEF para convalidar o entendimento e as exigências opostas pelo Oficial Registrador da Comarca de Ibirama, determinando que se abstenha de averbar os leilões negativos – e, por conseguinte, de proceder ao cancelamento da alienação fiduciária constante no R.11 da matrícula nº 13.193 – até que sejam renovados com observância das formalidades legais.

Expeça-se ofício ao Oficial do Registro Público, informando-o do inteiro teor desta decisão.

Sem custas (art. 207, da Lei n. 6.015/73).

Publique-se, inclusive no DJe (caderno administrativo). Registre-se. Intimem-se, inclusive o Ministério Público.

No caso de apresentação de recurso de apelação, intime-se o Oficial Registrador para, querendo, apresentar contrarrazões (art. 202 da Lei n. 6.015/73), no prazo legal (art. 1.010, § 1º, do CPC).

Em seguida, independente de nova conclusão, cientifique-se o Ministério Público e remetam-se os autos à Instância Superior (art. 1.010, § 3º, do CPC).

Após o trânsito em julgado, procedam-se às anotações necessárias e arquivem-se os autos.

Manoelle Brasil Soldati Bortolon

Juíza de Direito – 2ª Vara da Comarca de Ibirama

Direção do Foro